Alminhas
Uma cruz é vulgar com flores ou sem elas aparecer em
todo o mundo, em locais onde houve mortes, acidentes ou crimes…Tragédias…
Em Portugal e não só, a partir do século XVIII,
aparecem as alminhas, especialmente junto de cruzamentos ou entroncamentos de
estradas ou caminhos, nas aldeias ou nas cidades.
Uns mais elaborados do que outros.
Parece que esta cultural popular é única no Mundo, e só
existe em Portugal, segundo o historiador António Matias Coelho. Não é bem
assim. Já vi e tenho registos do sul, onde
é muito frequente também é no sul de Itália, na Alemanha, Bélgica, Espanha e em
outros países de raiz católica ou não, agora não me lembra. Estar à procura desses
meus registos é complicado. Houve talvez os que se varreram da memória digital
ou engolidos por algum vírus repelente. Os que encontrei publico-os…
Esta é uma manifestação de religiosidade popular à
volta da morte.
Às vezes aparece este pedido:
“Ó VÓS QUE QUE ESTAIS PASSANDO
LEMBRAI-VOS DE
NÓS,
QUE ESTAMOS
PENANDO.”
Ora algumas “Alminhas” são verdadeiros monumentos
arquitectónicos populares, fazendo parte do nosso património.
Há capelas, nichos, padrões isolados ou em paredes
junto de casas ou muros de quintais e, sobretudo, junto de cruzamentos de atalhos,
caminhos, ou mesmo ruas.
Em Dem, assim se traduzia que qualquer lavrador que
passasse com um carro de milho para desfolhar em casa, deixava em cada nicho ou
numa capelinha da Casa da Cerejeira de Cima, por exemplo, umas espigas. Outros
deitavam esmolas em dinheiro e o proprietário das “Alminhas” colhia e entregava
o dinheiro para mandar celebrar missas pelas Almas do Purgatório.
Também era vulgar ver deixar flores, ou acender
velinhas, ou deixar lamparinas de azeite, ou ao passar à sua frente os homens
tiravam o chapéu e as senhoras benziam-se, rezavam… Nos funerais, o cortejo
fúnebre parava e o sacerdote era obrigado a rezar um responso pela alminha do
cadáver que ia no féretro. Este último pormenor era obrigação popular
determinante para a salvação do falecido que tinha de percorrer o caminho que
sempre fazia de casa para a Igreja. Em algumas aldeias era necessário carregar
às costas o féretro, ou usar uma padiola ou utilizar o carro de bois, mas este
era menos usual.
Segundo o historiador da Chamusca e citado atrás
ninguém pode ignorar este património e por mais laico que seja o Estado, devia
haver um registo de todas as alminhas, algum historial de localização deste
património.
Esta tendência segundo o mesmo autor vem já dos gregos
e dos romanos, do paganismo, dos deuses dos lares, dos penates e dos héstias;
eu diria que vem já dos Celtas, pois a um canto dos cruzamentos os celtas
punham fogueirinhas, luzeiros, para as “almas penadas” (que andavam de noite) não
se perderem.
No entanto, a civilização grega e romana também
colocava em locais de catástrofes, ou mortes acidentais ou criminosas um
símbolo pagão que os cristãos substituíram por cruzes, cruzeiros ou outros símbolos
que marcavam o lugar com reverência e respeito cristão.
No nascer e no morrer todos somos iguais. Nascemos nus
e morremos como nus ficássemos de todo o bem material, até da roupa pode
acontecer.
Em algumas religiões, o corpo cadáver é envolvido num
lençol e enterrado.
Quando nascemos alguém nos aconchega, mas na morte,
todos, pobres e ricos fogem de nós porque entramos em putrefacção e começamos a
cheirar mal podemos ser um perigo para a saúde público. Há que enterrar ou
queimar. Já não se levam para o monte para alimentar os abutres. Aqui, também tanto
vale ser pobre como rico, todos somos iguais e nem os ricos levam nas mortalhas
levam bolsos, ou se levam fatos os bolsos vão vazios a menos que, por engano,
levem algum tesouro.
Nas alminhas que vemos pintadas ou esculpidas nos
caminhos, ou nos altares de igrejas, figuras curvadas ou de pé com mãos
erguidas ao Pai eterno, a nossa senhora e… no meio das almas aparecem bispos,
frades, famílias poderosas que vem corroborar aquilo que ficou dito: na morte
não há rico nem pobre, somos iguais.
Segundo o dicionário, alminha é uma alma pequena.
Alminhas no plural, referimo-nos, sobretudo, aos monumentos que encontramos nos
caminhos ou nos altares das igrejas e capelas com um recipiente para esmolas.
No entanto, alma é ar, sopro, respiração, princípio vital e religiosamente é a
parte mortal do ser humano, é pessoa, indivíduo, índole, vida consciência,
espírito, essência, fundamento, centro de gravitação.
Hoje este património material e imaterial está
desacautelado, muitos estão abandonados, cobertos de silvas, destruídos por
vandalismo, o que representa o deixar de ter significado o passado o vivermos
uma cultura vandalizada por um novo tipo de paganismo, de uma vida sem Deus e
de desprezo por todo o passado que fez a história do que hoje somos…
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