A CASA DO ERMÍGIO
A Casa do Cirurgião, nem sempre teve este nome desde
que ali foi construída em 1765 sobre uma outra muito mais antiga.
Alguns dos
seus restos (da casa forte do Ermígio, talvez a casa dum senhor Hermigius, nome
de origem germânica, senhor ou proprietário medieval destas terras,
antroponímico, por isso, que deve ter dado o nome ao Lugar do Ermígio) e cujas
paredes talvez tenham chegado aos nossos dias sob a nova construção a serviram
de cortes para as mulas.
É provável que a casa mais antiga fosse da família
dos Velhos que viveriam nas Penas, onde vivem ainda os descendentes da família
dos Liquitos e daí a razão do topónimo Velho que ainda aí se conserva.
Devia
ter sido aquela casa para onde Francisco Afonso (Rocha) veio, em 1654, de Stª. Maria
de Aborim, filho de Pedro Afonso e Catarina Gonçalves por casamento com Maria
Gonçalves, filho de Afonso Gonçalves e de Isabel Martins. Sucedeu que o João Francisco,
filho do matrimónio veio a casar com Justa Alves, de Vila Fria. Mais tarde, um
seu filho, o Manuel Francisco, viúvo de Antónia Rodrigues do lugar das Penas
(Regadia de Cima) casado, em segundas núpcias, com Ana Rodrigues, do Ermijo,
filha de Simão Rodrigues (Vila de Punhe) e de Ana Rodrigues, da Regadia, dos
velhos.
Um
filho deste casal, o António Francisco casado com Catarina Rodrigues teve uma
única filha, a Morgada, chamada Maria Rodrigues que, por sua vez, casou com um rapaz
da terra, chamado João Rodrigues Ribeiro, filho de Matias Rodrigues, do Souto,
e foram os bisavôs do Abade António Francisco de Matos.
Foi
no tempo deste casal que a casa foi construída. Não sei que nome teria nessa
altura, mas a Morgada era pessoa rica. Faleceu em 1823 levando um ofício de 46
padres, assim como o seu marido falecido 29 anos antes, levou também um 1º
ofício de 33 padres, um 2º de 29 e um terceiro de 28, o que é sinal de gente
rica. Acreditamos que os pobres da altura, naturalmente, tenham ido para o céu
mesmo com menos padres.
Deste
casal, autor presumível da Casa que chegou aos nossos dias, nasceu uma outra
Maria Rodrigues que casou em 1784 com o Tenente José António de Matos, filho de
José António de Matos e de Maria Gonçalves, de Chafé, e tivera 8 filhos, tendo
morrido uma Teresa sem geração.
Desta
geração do Tenente foram “Matos” para Vila Franca e para a Conchada. Ainda
desta geração vêm as raízes próximas do Padre João António de Matos, do seu
irmão Dr. José António de Matos (muitos anos Presidente da Câmara Municipal de
Viana e do Sport Clube Vianense, daí o Estádio de Viana), do Padre Francisco
António de Matos, do parodiante Mena de Matos e a outras tantas gerações de
Matos espalhadas pela região de Viana, Porto e Lisboa.
O filho José ficou na casa e casou com Maria
Barbosa de Almeida, filha de Simão António Barbosa de Almeida e Rosa Teresa
Miranda, vizinhos e moradores, onde hoje é a Casa do Esperta.
Esta
Maria era morgada e foi mãe de 11 filhos. Um deles, o Francisco, foi cirurgião,
tendo estudado no Porto. O Francisco, cirurgião, casou com Rosa do Espírito
Santo Moreira, de Darque e foi pai de Maria Moreira de Matos que herdou a parte
norte da casa que seu pai habitava, a referida casa que tinha sido partilhada
por três: o Francisco cirurgião, nascido em 1838 e falecido em 1922 que deu o
nome à Casa no seu todo, o Manuel Rodrigues Pereira, conhecido por Santa Marinha
por ser descendência de Forjães e sobrinho do cirurgião, e pela sobrinha neta
conhecida pela Rosa Barbosa de Almeida, nascida em 1891.
O
António casou com Rosa Rodrigues de Carvalho (Deiras). A irmã Rosa casou com
António Pereira Novo. Foi a que ficou com a casa que mais tarde ficou conhecida
por “Casa do Esperta”.
A
casa dos seus avós maternos ficou para a filha da Rosa, a Maria Barbosa de
Almeida, com a parte sul da casa do Cirurgião.Esta depois de ter casado com
António Pereira dos Santos que saíu pela primeira vez para o Brasil, como
sapateiro, quando tinha 29 anos. Voltou a sair em 1885, 1891 e em 1895 e nunca
mais cá voltando. Por lá morreu, tendo deixado a mulher com duas filhas: a Rosa
e a Maria da Conceição.
A
Maria da Conceição, nascida em 1895, casou com Joaquim Ribeiro, relojoeiro e foi
conhecido pela alcunha “Esperta” tendo dado o seu nome à casa em que ficou. A
Rosa ficou na casa e casou com Manuel Almeida de Riba, de Subportela.
Nesta
altura a casa do lado sul tinha uma entrada própria, mas o Stª. Marinha e o Cirurgião
partilhavam das mesmas escadas centradas à linda varanda da casa numa extensão
de 24 metros. Tinha umas artísticas linhas e colunata com belas bases e
capitéis que mais ideia davam de casa nobre e solarenga, não fosse a vinha que
se seguia a estragar-lhe um pouco a visibilidade, mas era o costume da época.
Consta
que a Morgada Maria Barbosa de Almeida, mãe de 11 filhos, morreu com fama de
santidade pelo que foi enterrada junto ao altar do Sagrado Coração de Maria,
zelado por muitos anos pela “Casa dos Estivadas” dum modo particular pela D.
Luísa.
Depois
do aumento à Igreja na década de 70 este altar foi deslocado e, na construção
antiga, ficava do lado esquerdo de quem entra na porta lateral e de serventia da
Igreja para a Sacristia.
Era,
de facto, uma pessoa amiga de fazer bem. Era rica e achava que devia pôr ao
serviço dos que precisavam alguns dos seus haveres, por isso tinha em sua casa
dois fornos: o forno da família onde se cozia pão para duas semanas e o forno
dos pobres onde se cozia o pão para dar aos que lhe batiam à porta. Não eram
assim tão poucos, dadas as dimensões do forno. Para além dele, também a existência
de uma espécie de Albergue que o saudoso Padre Matos, mais tarde fez continuar
na sua residência, casa própria, herdada de familiares antigos e que deixou em
testamento à Paróquia de Mazarefes.
Consta-se
que um dia uma pobre de Darque e já falecida, a quem ela tinha feito bem, terá
vindo bater à porta mais uma vez, apesar da Morgada ter também morrido e terá
declarado para quem passava: “ide trabalhar para as filhas da Morgada... Minhas
malandras...”.
Um
Padre conhecido por Padre Brinca, Brinca de alcunha, que foi residente na casa
que hoje é o Centro Paroquial, anexa ao Adro das Boas Novas, “requereu-a” e tendo
feito um exorcismo descobriu que, afinal, faltava ainda pagar uma promessa
feita a S. José, um resplendor para que pudesse ir para o céu.
Depois
da intervenção do referido padre consta-se que a referida “alma perdida” nunca
mais apareceu. Atribuiu-se isso a um milagre da Morgada.
O
Santa Marinha era filho da que, viúva, casou com o “Deira Velho”, também ele
viúvo, e que só passavam o dia juntos, pelo que, à noite, cada um ficava na sua casa. Os seus
pais eram o António Rodrigues Pereira Novo e Teresa Gonçalves, dos Carriços.
Morreu
com mal da garganta e solteiro, mas com dois filhos: um em Mazarefes e outro em
Vila Franca, tendo-os reconhecido, pelo menos à morte e compensados.
O
António Pereira era filho de Manuel Rodrigues Pereira, oriundo de Forjães,
filho de Joaquim Pereira e Josefa Rodrigues. Mariana Barbosa de Morais, filha
de António Luís Barbosa Amorim e de Isabel Maria de Morais era irmã do Stª.
Marinha. A Maria, costumava ir pela manhã levar o leite aos tios que moravam na
Quinta ao lado, “Os Bichos”.
Foi
ela que, ainda criança, encontrou pela manhã cedo os tios na situação de
amordaçados e assaltados.
Esta
Maria Barbosa de Almeida morreu debaixo do comboio na passagem de nível mais
próxima por acidente casual ou não, mas o que é certo é que ela andava com
perturbações mentais atribuídas à ausência do marido, e do abandono deste da
mulher e das filhas.
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