Abade
Matos
Apontamentos avulsos
O abade António Francisco de Matos
nasceu em 9 de Julho de 1860, em Mazarefes, filho de Francisco António de Matos
e de Antónia de Piedade de Passos Pereira Maciel, “de Castelo de Neiva”, ambos
lavradores. Eram seus avós paternos o José António de Matos, tenente da guerra
da Maria da Fonte, e Maria Rodrigues e maternos António Lourenço de Passos
Pereira Maciel, cirurgião em Esposende, e Maria Martins (de Figueiredo) ”do
lugar de Castelo de Neiva.” Era da casa dos quatro chicos: O Francisco António
Matos era o pai, o porco era Chico, o burro (cavalo) era Chico, e o criado
Francisco de Aguiar, de Barcelos. Ele próprio o dizia a brincar. Com o nome de
António foi feito cristão, pelo baptismo católico e pela mão do Pe. José de
Araújo Coutinho, por doença grave do Abade Manuel Rodrigues Lima, que era o
pároco, levado ao colo da madrinha Rosa de Jesus Passos Pereira Maciel, em 13
de Junho do mesmo ano, quatro dias depois de nascido.
Estudou em Braga. Era um jovem
inteligente, dinâmico, criativo e cheio de vida.
Conta-se que um dia apareceu em Braga
com uma bicicleta (......)
Ordenou-se sacerdote em 20/11/1887, e
foi nomeado pároco de Mazarefes em 1892. Faleceu confortado com os últimos
sacramentos, com 87 anos, em 07/03/1947. Foi ordenado pelo Arcebispo Primaz D.
António José Freitas de Honorato.
Celebrou as bodas de ouro sacerdotais
em 20 de Novembro de 1937.
Deixou à freguesia bens como a sua
casa para Residência Paroquial e cerca de 20.000m2 de terreno que ficou a fazer
parte do passal.
Nunca deixou morrer pobre nenhum à
fome.
Depois da morte dele, a única pessoa
da freguesia a precisar de ajuda foi a Maria Crasto, no tempo do Pe. Delfim, de
Darque quando esta ficou anexa àquela Paróquia. Era a família Galhofa que
preparava a lista.. Faça a lista que eu leio-a de semana a semana, dizia o
prior de Darque. No fim de cada missa era lida na igreja para que os
paroquianos fossem levar a comida a casa daquela família. Isto ainda conheci
porque só acabou quando dois filhos começaram a trabalhar e decidiram por
sustentar a família. Era criança de 9/10 anos.
Eram assim as listas:
1ª semana – Segunda-feira, Manuel
Rodrigues Gomes; Terça-feira, Inra D. Ezabel; Quarta-feira, Manuel Fernandes
Liquito; Quinta-feira, Manuel Fernandes Forte; sexta-feira, Manuel Gonçalves
Dias; Sábado, José da Costa Dias; Domingo, José Pinto da Costa
2ª semana Segunda-feira, Domingos
Rodrigues de Araújo Coutinho; Terça-feira, António Rodrigues da Rocha;
Quarta-feira, José de Araújo Vaz Coutinho; Quinta-feira, Manuel Gomes;
Sexta-feira, Viúva de Manuel Ferraz de Miranda; Sábado, Avelino Correia
Lavandeira; Domingo, Francisco Gonçalves de Souza.
3ª semana – Segunda-feira, Glória
Alves...; Terça-feira Alexandre R. Coutinho; Quarta-feira, Avelino Martins de
Souza; Quinta-feira, Ana Alves; Sexta-feira, Manuel Rodrigues de Araújo;
Sábado, José de Araújo Coutinho; Domingo, José Rodrigues de Amorim.
4ª semana –Segunda-feira, António
Augusto Vieira de Amorim; Terça-feira, Rosa Ribeiro Coutinho; Quarta-feira,
Miguel Afonso Forte; Quinta-feira, Manuel Agostinho Paulino; Sexta-feira,
Joaquim Alves Coutinho; Sábado, Armindo Delfim Correia Ribeiro; Domingo, Rosa
da Cunha.
5ª Semana – Segunda-feira, Conceição
da Cunha Meira, Terça-feira, José Gonçalves Pequeno, Quarta-feira, Artur
Augusto Matos; Quinta-feira, Viúva de Manuel Ribeiro da Riba, Sexta-feira,
Artur Pedro da Silva Domingues; Domingo, Francisco da Silva Coutinho.
6ª Semana – Segunda-feira, José de
Oliveira Silva Reis; Terça-feira, Teresa Rodrigues Leite; Quarta-feira, António
Rodrigues de Araújo Coutinho; Quinta-feira, António Ribeiro Gomes; Sexta-feira,
António Afonso Forte Ribeiro
7ª Semana – Segunda-feira, Agostinho
Rodrigues de Carvalho; Terça-feira, Engrácia Fernandes Dias; Quarta-feira,
Manuel de Matos Gonçalves da Cunha; Quinta-feira, Manuel Francisco Rodrigues;
Sexta-feira, João Rodrigues de Carvalho; Sábado, António Rodrigues Carriço;
Domingo Maria Rodrigues Vaz.
8ª Semana – Segunda-feira, José Gomes
da Cunha; Terça-feira, João Matos Gonçalves da Cunha; Quarta-feira, Joaquim
Dias Felix; Quinta-feira, José Gomes da Cunha; Sexta-feira, José Rodrigues
Reis; Sábado, José Fernandes Liquito; Domingo, José Rodrigues de Araújo.
Não o conheci, pois faleceu no ano em
que nasci, mas era um padre muito piedoso, generoso, um bom amigo, culto,
poeta, amigo dos pobres e dos doentes, crítico e ouvi vários testemunhos de pessoas que lhe
ajudaram à missa, andarem na catequese dele, pessoas que ele casou e destaco
agora algumas dicas que disseram dele, como um santo e um homem muito bem-humorado,
alegre e brincalhão.
Duas piadas dele:
· Na casa do visconde de Vila
Franca, e num dia de aniversário, uma
das filhas, a mais nova do visconde que estava casada para a casa do Junqueira
de Mazarefes, vestida com um vestido da cor de canário... - "Aquela menina
lá ao fundo vestida de canário"....
- O canário é meu, o canário tem
dono, responde o marido...
· Quanto a D. Júlia que casou com D. Tomás ... vinha à missa a
Mazarefes, no fim iam cumprimentar o Abade à sacristia.
Ai meninas eu tinha um soneto feito
ao meu pintagalhinho (canário).
-
Diga o soneto, então.
-
Não
digo que envergonho as meninas....
-
É
assim:
Meu bichinho
Doudivanas
Também pintas as pestanas
Também pintas o biquinho...
Ai que nojo meu bichinho.
O Abade Matos foi Presidente da Junta
da freguesia desde 1896 a 1910.
“Eu pertenço à freguesia mais rica de
Viana do Castelo” dizia ele a quem o interpelava: - "Ai Abade o que será
de Mazarefes quando o senhor faltar, e continuava, respondendo:” tem bom
Alfaiate (O Pulcena), bons Carpinteiros (Geraldo, o Néné e o Simplício), bons
Cesteiros (os Galhofas), boa Banda de Música (a Banda do Carvalho), bons
Pedreiros ( Zé da Mata e Rocha), bons Fogueteiros (os Miras), bom Latoeiro(o
Luciano Carvalho), bons Ferreiros ( Cunha e Forte), bom Sapateiro (o Enes) e
vários lavradores abastados. Portanto Mazarefes, segundo ele, não precisava de nada.
Era uma terra rica. Tinha de tudo e bastava-se a si próprio não precisava de ir
buscar fora.
Tinha gosto artístico e, a propósito,
quando ia a Subportela dizia para os daquela terra: Olha que Santos feios,
olhando para as imagens da igreja. Em Vila Franca, gozava os daquela terra com
a imagem do (…). Ao parar em frente dela dizia com a sua graça natural: quando
tirais este “gajo” daqui?... pois era uma imagem com a cabeça muito grande.
Então os de Vila Franca trocaram a imagem, mas arranjaram uma imagem maior que
mal cabia no nicho. – Ó, tiraste um e puseste outro que nem cabe em casa,
continuou ele a brincar.
Aliás ele tinha um espírito muito
crítico e por isso, pôs aos de Mazarefes uma alcunha a cada habitante por assim
dizer. Punha nomes a toda a gente: És bacôlo.
Uma mulher forte, irmã do Pe.
Américo, pároco de Gondarém, veio servir para a casa dele e deu-lhe as dores.
Curava ele, como era costume, as dores de barriga com testos quentes. - Alto,
isto não é nada comigo... ide chamar a ti’ Ana Dias e preparai-me o burro para
a levar para casa dela, a Alvarães.
Na febre pneumónica, só deixou morrer
uma senhora, a mãe do Zé “Pirralho” por estar de parto, a mãe do Zé Dias e não resistiu,
aliás era costume dizer-se: Quando viesse o médico a alguém, já se sabia que
era para morrer...
Houve um dia uma confessada, na
Igreja de Vila Franca e havia duas sacristias: uma a sul e outra a norte. O Pe.
Manuel Salgueiro de Subportela, o Pe. Zé Pinto, de Vila Fria, o Pe. João Matos,
o Pe. Francisco Matos e Pe. Fernandes de Deão, eram os confessores.
Ao sair da sacristia vê um “polícia”
e diz o de Vila Franca: - porco..., porco..., Diz o Pe. Francisco Matos de
seguida: - porco não, porca sim.. – Tu és poeta, diz o Salgueiro. - Olha rapaz
(para o Prior que era novo) -Tu és novo, és rapaz, tens muito que aprender, mas
tu, Salgueiro, és parolo porque és velho e não sabes que mijado sobre cagado é
de mulher e não é de homem...
Era todo da casa do Estivada, e amigo
de Celestino. A primeira mulher do Joaquim Estivada, assim como a segunda que
era a Joana Gandra, cozinhava e lá comia com a família.
Ele passava a noite toda à beira de
um doente. Disse o Prior de Vila Franca, no seu funeral: - o vosso pároco viveu
como um anacoreta, que nem à cama ia. E é verdade que vinha a casa comer à meia-noite
e depois ia passar o resto da noite junto do doente...
Chamavam-lhe o “Pardal”. Assim como
alcunhava os da sua terra, também o alcunharam a ele.
Não era republicano, nem monárquico,
mas “ regenerador” e nesta política comungava com os Miras. Um dia os Miras “assaltaram-lhe”
a casa, na hora da liberdade da República, mas nada para mal. Eram amigos e
respeitavam-se.
Não calçava botas, mas sapatos
”branquinhos” era um género de sapatos de pano para sair ou ir a Viana, pois na
missa usava pantufas. Para o caminho da aldeia eram os socos os seus
companheiros e meias de lã de ovelha. O castiçal que tinha na sacristia era um
solitário partido onde metia o toco da vela. Para andar de noite usava uma cana
com um prego na ponta, onde dependurava um lampeão, andava sempre com um
barrete redondo com três dedos de aba e na igreja antes da missa rezava sempre
com o barrete. Era calvo, raramente usava a batina, usava mais o viatório e
capa ou “guarnacho”. Ele tinha muito cuidado com a saúde.
Era primo do Pe. João Matos, de Vila
Franca e primo do Cirurgião Matos de Mazarefes. O seu pai casou duas vezes. A
primeira mulher veio do Castelo do Neiva e trouxe uma sobrinha para criar. Era
ela tão bonita rapariga que não lhe faltavam pretendentes e, sobretudo no
Castelo pelo que veio a casar com o tio aos 75 anos de idade da qual ainda o velhote
teve 5 filhos, um deles o Abade.
O pai do Abade casou para a casa das
Castelas. Dali saiu a irmã do Abade Matos que foi mãe do Pe. Albino, da Meadela
e aí nasceu também o Abade.
Era investigador, poeta, “médico”,
artista, um amigo dos pobres. Mantinha um albergue e o povo tinha-o como um
sábio e um bom padre.
O Pe.
António Quesado, jovem prior, pároco de Vila Franca, aconselhou a celebrar as bodas de ouro
sacerdotais e o Padre Matos fez a vontade, reunindo em Mazarefes, e na sua
residência, muitos padres.
Às vezes citam-no, dizendo que «a
mulher tem sete manhas e a raposa tem a manha de sete mulheres... e sete vezes
sete ....»
Consta que o cadáver do “Rosalina”
não se desfez no cemitério, passados muitos anos e o abade Matos pegou numa
vara de lodo e deu-lhe uma pancada e desfez-se logo.
O seu sobrinho Pe. Albino Maciel de
Miranda entre 1945 e 1946 fez o serviço do tio na Paróquia, pois ele
mostrava-se já muito debilitado pela saúde e pela idade.
Era muito alegre, divertido.
Raramente se deitava de noite e nos últimos anos nunca foi à cama. Dormia numa
espreguiceira. Quando não tinha doentes com quem passar a noite, ia fazer serão
para a casa do Alexandre de Araújo Coutinho, meu bisavô... Ia de Verão ou de
Inverno da sua casa directo, pelo caminho de terra, lama e pedras, com o
lampeão na ponta do pau passar o serão até às tantas depois regressava para se
esticar no alpendre, espécie de torre ao centro da casa para a qual subi quando
criança e se via tudo à volta até Viana pelas vidraças que a rodeava.
Ainda conheci, onde ele estudava, rezava,
escrevia e dormia um pouco antes da missa.
O Património para a ordenação foi-lhe
feito pela mãe, viúva, em 16/08/1878 quando ele tinha ainda 18 anos.
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