Sabemos, por experiência, que a dor e o sofrimento fazem parte da vida. Um tema inexplicável que nos entristece e angustia. De onde vem e para que serve? Um sofrimento causado muitas vezes pelas nossas más escolhas, que nos ferem a nós próprios ou aos outros. A um nível mais global, a liberdade mal entendida de outras pessoas também nos pode causar sofrimento. E existem, a nível da própria natureza, fatores diversos que deterioram o organismo humano, ou os fenômenos e catástrofes naturais que des- troem parte do mundo e dos homens, em maiores ou menores dimensões.
Não há explicação fácil para o sofrimento e, muito menos, para o dos inocentes. A dor continua a ser um mistério. Um mistério que apenas o cristão com fé vai aprendendo a descobrir e a com ele conviver.
A dor apresenta-se de muitas formas e em nenhuma delas é espontaneamente querida. Isto não justifica que nos devamos encher de compaixão por nós mesmos, que não devamos ser fortes e solícitos na procura dos meios com que podemos ultrapassá-la, que nos deixemos abater. Não faríamos outra coisa porque, na realidade, existem sempre maiores ou menores contrariedades. Pelo contrário, devemos procurar reagir e impedir a imaginação de transformar qualquer incomo- didade em tragédia, reduzindo os pade- cimentos às suas verdadeiras dimensões. Mais ainda: devemos procurar "esquecer" as nossas mágoas para pensar nos outros e servi-los, como é próprio da primeira de todas as virtudes cristãs, a Caridade.
Não é fácil dar resposta ao mistério da dor. É verdade que existem explicações que nos fazem vislumbrar o seu sentido, ainda que sempre se nos apresentem insuficientes diante da tragédia do mal no mundo, do sofrimento dos inocentes ou do triunfo, ao menos aparente, dos que fazem o mal. É um tema de reflexão de suma importância, um enigma em que apenas a partir de uma perspetiva cristã se pode avançar realmente, para a entranha do problema; mas uma reflexão que não nos distraia da batalha diária para perceber e enxugar a dor das demais pessoas, procurando fazer dessa experiência algo que nos ensine, que nos faça crescer, que não nos destrua.
Referimo-nos à batalha contra a desesperança, esse estado anímico que dilacera a alma de tantas pessoas que não encontram sentido para o que acontece nas suas vidas, que as faz arrastar "os pés da alma" e caminhar pela vida com uma espécie de fatalismo dramático. A dor própria é talvez a melhor advertência para reparar na dor dos demais, para manifestar-lhes o nosso afeto e a nossa proximidade, e tornar assim mais humano o mundo.
Celebramos em 11 de Fevereiro o "Dia do Doente"e mais um aniversário da publicação da Carta Apostólica Salvifici Do- lores, de João Paulo II, em 1984, onde discorre sobre o sentido cristão do sofrimento que tem o seu fundamento, entre outros, na Epístola de S. Paulo aos Colossen- ses (1,24): "Completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo seu Corpo, que é a Igreja".
Diz o João Paulo II: "O sentido do sofrimento é verdadeiramente sobrenatural e, ao mesmo tempo, humano; é sobrenatural, porque radica no mistério divino da Redenção do mundo; e profundamente humano, porque nele o homem se aceita a si mesmo, com a sua humanidade, com a própria dignidade e missão."
"No programa messiânico de Cristo, que é ao mesmo tempo o programa do reino de Deus, o sofrimento está presente no mundo para desencadear o amor, para fazer nascer obras de amor para com o próximo, para transformar toda a civilização humana na "civilização do amor".
Com este amor é que o significado salví- fico do sofrimento se realiza totalmente e atinge a sua dimensão definitiva".
Estas palavras sobre os atos de caridade relacionados com o sofrimento humano, permitem-nos descobrir, por detrás de todos os sofrimentos, o próprio sofrimento redentor de Cristo, presente em quem sofre. Todos os que sofrem foram chamados a tomarem-se participantes "dos sofrimentos de Cristo".
A dor e o sofrimento são inerentes à condição humana. Normalmente, o sofrimento suscita compaixão, inspira respeito e, a seu modo, intimida. Mas não há dúvida de que nele, efetivamente, está contida "a grandeza de um mistério específico". Mistério insondável do sofrimento humano que não é apenas o decorrente da dor física, mas também sofrimento moral, que provém da dor da alma, da dor espiritual e que, em cada caso, é benéfico, porque redentor.
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