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sábado, 25 de fevereiro de 2012

Paróquias e dioceses, grandes ou pequenas. Que problemas para a Igreja?

A realidade ai está. Não se pode iludir. Tempos houve com muitos padres, criavam-se paróquias para lhes dar lugar. Agora, diminuiu a população, há paróquias desertas, que permanecem entidades canônicas, mal servidas por padres que correm, porque o seu número diminuiu. Há dioceses com menos população que grande paróquias das zonas urbanas, ao lado de dioceses normais e de outras, com uma extensão geográfica e popula­cional, que não lhes é fácil a ação pastoral renovadora, recomendada pelo Vaticano II. Tornou-se difícil operar a renovação da Igreja, mediante a ação direta junto das pessoas e a sua participação nas comu­nidades. Por razões óbvias, nas dioceses e paróquias com pouca gente, manter ou edificar comunidades vivas, com uma po­pulação residente diminuta, envelhecida e pouco dada a "novidades" na religião, parece pesadelo ou ideal sem consis­tência. Gente a mais por um lado, gente a menos por outro, num país pequeno, onde a mesma Igreja tem a responsabi­lidade de evangelizar, alimentar a fé e ajudar a crescer, onde quer que as pessoas vivam e qualquer que seja a sua idade e capacidade... Nesta Igreja, que deve ser uma comunhão efetiva de Igrejas Irmãs, subsistem comunidades, umas ricas com meios e recursos de sobra e onde se es­banja, e outras empobrecidas de pessoas e de meios, onde cada dia tudo se torna mais difícil, e onde a solidariedade se devia sentir. Esta, desde longe, uma realidade da Igreja em Portugal..
Na sociedade sente-se igual problema em relação a freguesias e municípios, o que levou o poder político a tomar medidas de solução não pacífica. Se a situação é semelhante, em regra as freguesias são paróquias, na Igreja e no Estado as propos­tas variam pela natureza das entidades, havendo, porém, vantagem de alguma reflexão em comum, não para reivindicar, mas para abrir caminhos. Diferentes, em­bora , os problemas não são separáveis. As respostas, dado o objetivo prosseguido, é que não são coincidentes. Enquanto no Estado se tenta um caminho que responda às necessidades dos cidadãos, suprimindo e anexando, na Igreja, o caminho deve ser outro. Há paróquias já anexadas e padres ao serviço de várias, que, todas juntas, nem sempre somam mil habitantes. Esta solução fora do tempo, pela referência e tônica clerical, que, além de transitória, nada tem de tranquilizadora, por estar cheia de novos problemas, sobretudo no que se refere ao equilíbrio humano e espiritual do? padres e à dificuldade de satisfazer direitos e deveres dos cristãos. Todas as estruturas da Igreja estão ao serviço das pessoas, são transitórias e duram enquanto promovem e não difi­cultam nem impedem a vida dos cristãos e das comunidades. Ao longo da história, muitas delas foram fruto de pressões e de interesses, estranhos ao sentido eclesial e ao bem espiritual. Passados séculos e, mais recentemente, dezenas de anos, o erro mantém-se e, apesar da vida que mudou, estruturas caducas permanecem intocáveis. O que se inova é tirado a ferros, e logo se fecham portas, não venha aí a tentação de mais novidades pastorais. A criação de seis novas dioceses no século passado, nunca foi pacífica, dado inte­resses tocados e prestígios beliscados. A história está feita. Entretanto, houve um concilio, muitas coisas mudaram na Igreja e na sociedade, deram-se orientações... Mas o povo continua sem voz e o zelo e o bom senso, apenas privilégio de alguns. O problema das paróquias e das dioceses, grandes ou pequenas, não é questão de números e territórios. Presente a neces­sidade de acertos, por vezes urgentes, o problema é de bairrismos ferrugentos, da mentalidade de quem preside, das pressões corporativas, da pouca liberdade de participação, permitida aos cristãos afetados. O padre é indispensável para o que lhe é específico, mas a solução é eclesial, não clerical. Há capacidades não aproveitadas no Povo de Deus, frente à realidade e urgência da missão. Criam-se, mundo fora, dioceses com um enorme ter­ritório e um número diminuto de padres. E funcionam, crescem e geram comuni­dades. Contam com o que têm, abertas à solidariedade de outras, nem sempre das mais ricas. Na Igreja, como na vida, quem mais ajuda os pobres, são os pobres.
No caso das paróquias do interior, há ca­minhos em aberto para explorar: unidades pastorais de espírito conciliar e prática sinodal; equipas eclesiais, com lugar de direito aos leigos e, com eles, em atitude ativa de procura e experiência; abertura a novos ministérios e a experiências válidas, já testadas noutras zonas; programação realista, olhando as pessoas, as suas ca­pacidades e necessidades; reflexão aberta sobre os problemas, a nível diocesano e nacional, com gente que conheça, pense e deixe pensar... O que se está a fazer, na maioria dos casos, não vai além de uma pastoral de conservação, sempre com base no padre, pronto para celebrar muitas mis­sas, mas sem tempo para rezar, estudar, acolher, educar na fé, e abrir horizontes de vida, àqueles a quem sempre foram fechados.
A Igreja em Portugal precisa de parar e repensar, não a partir das franjas pastorais, incômodas para quem vê de fora, mas da vida das pessoas e das comunidades. Precisa de conversão dos responsáveis, a exemplo de João XXIII e de Paulo VI, que se negaram a privilégios de séculos e escolheram o caminho de Paulo (Fil 2, 3-4), considerando os outros superiores a si próprios, procurando não o seu próprio interesse, mas o dos outros. Isto exige des­cer, voluntariamente, do carro do poder e das honras, e trilhar o caminho pedregoso dos pobres e falar aí a sua língua. O carro triunfal não volta. Acabou o tempo dos senhores e dos donos das pessoas e do templo. O lugar de Cristo só a Ele pertence. Agora, é o tempo, evangélico e privilegia­do, da Igreja serva e pobre, que, de pés no chão, luta e sofre para dar testemunho da verdade e ser sinal de salvação e de esperança. Poderá haver sempre e mais ainda em tempos de crise, algo de mais fascinante para um servo do Povo de Deus e que sente, dia a dia, as urgências do Reino?
D. Antônio Marcelino bispo emérito de Aveiro




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