As pessoas e as máquinas
Ninguém se lembra de cortar queijo com um serrote ou uma grossa tábua de carvalho com uma faca de cozinha. Para cada atividade, a ferramenta apropriada. E há o cuidado de procurar que os instrumentos estejam em boa forma. Com uma faca cheia de bocas ou com umas tesouras por afiar não se corta em condições.
2. 0 que se não faz com os instrumentos faz-se, às vezes, com as pessoas.
Qualquer gestor de recursos humanos minimamente consciente das suas responsabilidades procura conhecer o trabalho a fazer, -ver qual é a pessoa mais apta para o desempenhar, cuida da formação profissional dessa pessoa.
É assim uma coisa parecida com o trabalho do treinador de uma equipa de futebol. Procura conhecer as capacidades de cada um dos jogadores, coloca cada um no seu lugar e providencia para que, aí, tenha condições para dar o máximo rendimento. Numa sociedade como a nossa, em que a especialização é cada vez mais uma exigência, deixou, praticamente, de haver lugar para os homens dos sete ofícios. É certo que continua a haver os faz-tudo, mas são cada vez mais raros.
Cada pessoa no seu lugar. Cada um, a desempenhar as funções que melhor quadram com as suas capacidades e com aquilo para que se sente particularmente vocacionado. Um bom cabeleireiro pode ser um mau canalizador. 0 homem certo no lugar certo.
Um trabalhador colocado fora do seu lugar é uma pessoa que não rende o que dela pretendem exigir. É uma pessoa habitualmente triste, por vezes revoltada e con- testatária (quando não é obrigada a sofrer em silêncio), que se não sente realizada e acumula frustrações. E quando se trata de lugares de chefia, ocupados por quem não tem as qualidades necessárias para os exercer, quem as paga são os subordinados.
3. Uma norma basilar para que um trabalhador produza é o gosto com que desempenha a sua função e a alegria que respira no seu ambiente de trabalho. Uma coisa é o ar macambúzio de quem desempenha uma tarefa como quem arrasta um pesado fardo de que se não consegue libertar e outra, o trabalho que se faz assobiando ou cantarolando.
O bom ambiente de trabalho deve ser uma preocupação de todos os que pertencem à comunidade onde o trabalho se realiza. Depende dos trabalhadores e dos gestores. Depende da forma como as pessoas se relacionam. Do modo como falam e como lhes falam. Das palavras de estímulo e de incitamento que recebem. Das condições físicas em que o trabalho é realizado.
Dispor de humanas condições de trabalho é um dos direitos fundamentais do trabalhador e uma das grandes obrigações dos da- dores de trabalho. Se Com as máquinas se têm particulares cuidados, porque custaram dinheiro e é necessário que deem rendimento, por que não há de haver cuidado no trato com as pessoas?
As pessoas não são comparáveis às máquinas. São muito mais. Infelizmente, às vezes fica-se com a impressão de que são tratadas como se fossem menos.
4. As pessoas são sensíveis às manhãs de nevoeiro e às mudanças bruscas de temperatura. Há pessoas que vão para o trabalho após uma noite mal dormida por motivos muito diversos e muito válidos. Há pessoas que vão para o trabalho com dramas pessoais ou familiares de que se não conseguem libertar. Uns momentos de conversa com um dos responsáveis pela comunidade de trabalho e um gesto de compreensão são atitudes que têm u valor inestimável.
Quando não há tempo para isso, porque todos os segundos têm de ser aproveitados no desempenho das tarefas confiadas às pessoas, independentemente da sua boa ou má disposição do estado normal de saúde de uma arreliadora ou arreliadora dor de dentes que não foi motivo suficicente para faltar ao trabalho...
5. E a formação profissional? Um aspeto a que nem sempre se presta a devida atenção mas que é fundamental para que se trabalhe melhor e se produza mais; às vezes com menor esforço. Cuidar da formação profissional; um importante investimento, mas nem todos o veem como tal. A verdade, porém, é que as pessoas não nascem ensinadase necessitam de conhecer as modernas tecnologias. Mas o tempo livre de que dispõem faz-lhes falta para cumprirem deveres pessoais e familiares e para descansarem.
6. As pessoas e as máquinas. Não haverá pessoas desejosas de, salvas as devidas proporções, receberem um tratamento semelhante ao que se dá às máquinas? Não haverá empregados desejosos de, salvas as devidas proporções, serem tratados como o automóvel do patrão, muito limpinho, com as revisões em dia, as mudanças de altura própria, os pneus devidamente calibrados, uma condução que evita lacadas, etc. etc….
Silva Araújo, in DM de 28/06
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