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domingo, 18 de março de 2012

A Dor por Eugénio Zolli in revista Carmelo

Da Revista Carmelo

“O mais belo hino ao Criador surge dum coração despedaçado pela dor”



A dor

Porquê? Para quê?

Que há de maior, mais puro, mais santo, mais humano, e mais divino que a dor? Na dormo0 homem encontra-se com Deus; na dor e no amor, o homem levanta-se para Deus. Na dor e no amor de Deus funde-se com o homem.

No místico livro dos palácios celestiais (Sefer hekhaloth) Deus é chamado “Rei ofendido”. Ele deu tudo ao homem, e o homem ofende-o com pensamentos impuros, com sentimentos e desejos vis, com pecados abomináveis.

E, apesar de tudo, Ele, o Grande Paciente, ama os homens e continua a derramar entre eles os seus bens com liberdade e abundância.

O Senhor é chamado Rei da paz; o Rei a quem pertence a paz. É chamado o “Justo do mundo”; os homens umas vezes são justos, outras injustos. O Senhor, cujo santo Nome seja louvado agora e par sempre é o Justo.

No místico Livro do esplendor (Zôhar), Deus é chamado com o estranho apelido de “o Pobre do mundo”.

“Quando recebes como prenda – diz a Sagrada Escritura – o vestido do pobre, procura retribuir-lho antes do pôr sol; trata-se dum pobre; o vestido que reténs é o único que o pobrezinho possui: com que se cobrirá? “ (No oriente o pobre usa o vestido para se cobrir de noite).

O pobre poder-me-ia suplicar e eu acolheria propício o seu clamor, porque eu sou clemente…

O Senhor é o Pobre do mundo. Espera o dom das nossas preces. Sai o sol, passa a manhã, brilha triunfante o ardente meio-dia, o dia caminha para o seu ocaso, o sol vai esconder-se; escondeu-se… O Senhor, o grande Pobre, espera, espera ainda…

As trevas envolvem a Terra; uma a uma, as estrelas no céu se acendem.

Vão chegando as petições…

O murmúrio dos lábios de cada um, de poucos, muito poucos…

Falam os lábios enquanto o coração se cala…

Quanta tristeza! Quanta dor!...

E a dor que une o homem com o Senhor, põe o Senhor mais perto do homem.

O homem da dor é o Servo de Deus no livro de Isaías.

Está aí, diante de nós…, mudo como um cordeiro…

Apresentou o seu corpo àqueles que o feriam e não cobriu o seu rosto ante os insultos e os escarros…

Ele levava sobre si os nossos sofrimentos…

Ele caía ao peso dos nossos pecados. Nas suas feridas estava o remédio para nós… N’Ele, o senhor castigou as culpas de todos nós…

Ele que jamais usou da violência, que não grita nem faz barulho, que não quebra a cana fendida nem apaga a torcida fumegante foi contado entre os ímpios, enquanto carregava sobre os seus delicados ombros o enorme peso das culpas de tantos…

Bem-aventurados os que sofrem, os dolentes.

Dolente é o Senhor.

Glória ao Dolente.

Seis séculos depois dos Cânticos do Servo de Deus passou por esta terra o “Grande Dolente” cuja vida e paixão, morte e ressurreição encontrou nos Cânticos do Ebed Yahvéh (Servo de Deus) a sua admirável e misteriosa explicação e que por sua vez “revelou aos vindouros toda a profundidade do seu conteúdo”.

O Ebed é a aurora que anuncia a grande Luz de Jesus Cristo.

Na dor e no amor e a personificação mais sublime, mais pura, mais santa da dor e do amor, no grande dolente, o homem desta terra, desta terra miserável e ensanguentada, voltará a encontrar a Deus.

Na dor nascida da caridade, na caridade unida à dor é onde Deus fala.

“Até mim – assim reza o livro de Job – chegou uma furtiva palavra e o meu ouvido captou o seu eco…”.

Ao Senhor seja dado todo o louvor, Glória e para sempre…



Eugénio Zolli

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