Cultivo do Vinho
Depois da época quente, tempo de praia e da época das colheitas chega
o começo da queda da folha e com a folha a cair no chão, o viticultor começa a
pensar na poda das vinhas. Antigamente era outra época de grande ajuda
solidária para que o trabalho fosse mais rápido, mais alegre e organizavam-se
as podadas, convidando-se os vizinhos, os familiares ou amigos.
Era assim que começava o primeiro trabalho de cultivo do vinho.
As videiras eram cortadas ao cumprimento e aparadas alguns sarmentos
deixando outros a ficar a puxar pela seiva, pela força e energia que a terra
lhes dava e ao chegar a primavera começavam a deitar os primeiros rebentos.
Com os rebentos abertos começava outro tipo de trabalho com cerca de
15 dias intermédios. Era o trabalho do sulfato.
Eram cerca de 6 a 7 sulfatagens de todas as vinhas, assim como o
trabalho de passar pelas vinhas e cortar ou arrancar com as mãos alguns
rebentos a que chamavam “ladrões”, porque estavam a sobrecarregar a videira,
retirando-lhe seiva, melhor, o alimento para chegar às videiras que já tinham
flor e as uvas verdes a quererem medrar.
Assim cresciam os cachos maiores ou menores com mais uvas ou menos de cor
verde. Com o amadurecimento começavam a tomar a sua cor natural e tanto amadureciam
e se faziam mais doces quanto mais sol apanhavam.
Quando tinha 12 anos a colheita do vinho era sempre para fins de
Setembro, princípios de Outubro.
Hoje as coisas são diferentes. São as vindimas e são mais cedo.
Outro trabalho comunitário era importante na lavoura e lá estavam os
amigos, os vizinhos e as famílias para vindimar agora aqui e depois para o
outro. Tornavam-se momentos alegres, trabalhosos, mas menos pesados até pela
mão e pelo coração que davam uns aos outros para se sentirem felizes por mais um
tarefa acabada.
Este é um trabalho que depois continuava em casa. As uvas
eram carregadas em dornas e estas transportadas em carros de bois. Chegadas as
uvas a casa tinham de ir para o lagar espremidas.
A esmagadeira era feita de gamelo sobre uma
estrutura de madeira que aguenta o gamelo onde eram deitadas as uvas que caíam
logo nos dois cilindros que rodavam, dentados e
de ferro fundido enquadradas nessa estrutura de madeira ligados por uma roda de
ferro que ficava do lado exterior que através de uma manivela era transmitido o
movimento para rasgar os bagos.
Como criança cheguei a fazer este trabalho que era
duro e, como criança que era, também não aguentava e lá vinham quem tinha de
vir para acabar o trabalho.
Em casa as uvas eram
descarregadas gamela a gamela para a masgadeira. Enquanto uns descarregavam
outros esmagavam as uvas e o líquido de baco, assim como o brolho (cascas das
uvas e grainhas) ficavam espalhados pelo lagar.
Ao fim de dois dias normalmente começava a ferver e
nesta altura há quem faça papas de vinho doce tirado do lagar com farinha de
milho, mas quanto mais fervesse melhor, melhor cor e mais álcool, mas quando
deixasse de ferver começava a ir abaixo e, nesta altura, era tirado do lagar
para uma pia onde o líquido era levado em canecos para os tonéis ou para as
pipas. Era nessa altura que só ficava o brolho no lagar. Quando o mosto fervia
no lagar tinha de ser mexido de vez em quando e a fervura quanto mais durasse o
tempo do mosto estar em cima, isto é, a fervura. Com o vinho libertava dióxido
de carbono com uma temperatura que pode atingir os 25 graus o que levava algumas
pessoas à morte ao cair no lagar ou, ao meter o nariz para saber ao que
cheirava o produto. Ora o dióxido de carbono é fogo e aquecido a 25 graus a
entrar pelas narinas dentro outra coisa não é de esperar.
Então recorriam à prensa para espremer o brolho que
ainda tinha muito líquido para aproveitar e lançar nos pipos com os canecos. O
trabalho de espremer o brolho não era fácil. Era usada uma prensa sobre uma
grande base de pedra arredondada e com um veio (um sulco) onde o vinho saía
pelas ripas e caía no referido veio inclinado para um ralo que ia ter a uma
pia, donde se carregavam os canecos de 20 ou 12 litros para levar para a Adega.
Este aparelho da prensa sobre a referida pedra leva
duas cestas ou caniças meios calotes esféricas superficiais de ripes apertadas
por três meios aros de ferro com umas ganchetas onde funcionam umas chavetas
que prendem tramam as respectivas caniças. Ao centro funciona um fuso e no cimo
o macaco de cabilhas o ferro anexo ao macaco que através de um ferro cumprido a
este aparelho é que fazia o macaco rodar sobre um ferro anexo que pousava sobre
2 cepos ou mais que pousados sobre duas meias-luas, os pratos que eram
colocados por baixo dos cepos sobre o brolho bem estendido para apertar bem os
restos dos bagos e grainha e descobrir algum vinho a mais.
Depois de uma prensa espremida era retirado o brolho espremido para
uma dorna e acamado para ir depois para o alambique fazer aguardente.
Ia-se deitando mais brolho e
assim até ao fim.
Acontecia que este era o bom vinho, vinho para as festas, para os
amigos ou para vender.
Às vezes o vinicultor deixava algum brolho a que misturava mais umas gamelas de uvas e esmagadas sobre o pouco brolho,
juntavam uns canecos de água.
As poucas uvas faziam ferver de novo o brolho com a água, embora menos
tempo.
Chamava o vinicultor a este vinho água-pé e pesava cerca de 4º graus
para consumo de casa, mais sujeito a estragar-se depressa, sobretudo por causa
do clima.
O primeiro vinho tinha mais graduação 8 a 9 graus. Era mau se fosse
menos do que isso. O caso a que me refiro era o vinho verde tinto.
Assim era naquele tempo, pois hoje existem métodos mais simples, mais
confortáveis, mais leves até para terem uma graduação maior.
Este cultivo do vinho agora está praticamente abandonado, não só pelo muito
trabalho, pela muita despesa, e ninguém o comprar porque as adegas cooperativas
o vendem com melhor qualidade.
Quem o cultiva em grandes quantidades leva-o à Adega Cooperativa.
Isto para não falar das exigências da Comunidade Europeia com as suas regras,
às vezes desrespeitando a identidade dos povos com pouca eira e pouca beira, ou
de dimensões de superfícies mais pequenas.
Nem tudo está acabado, os cestos, os Canecos e as gamelas podem ser
lavadas e arrumadas, mas falta chegar a época em que o brolho acamado em dornas
e bem tapado para não apanhar ar, pudesse ir para o alambique de onde saía do
brolho a respectiva aguardente que não servia só para os homens matar o bicho
pela manhã, como para as mulheres que ajudavam na faina dos campos, no verão,
para não beberem vinho, pediam um refresco de água, aguardente, açúcar pouco e
sumo de limão.
Portanto quem colhesse vinho colhia aguardente que também fazia de
remédio para as constipações, gripes e rouquidões. Para isso pegavam num prato,
lançavam a aguardente, deitavam açúcar e punham-lhe o fogo e o açúcar que
ficasse no fundo com alguma daquela água quente era bebido, metido à boca com
uma colher e limpo o prato ia-se para a cama dormir…E pela manhã já aparecia
curado ou quase curado.
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