O que tem a ver o lar com a família, quando dizemos que o casamento de alguém constitui um Lar?
Ora, o conceito de família, para mim, é um núcleo da sociedade o mais privado possível, o mais íntimo, onde há regras, onde há Amor que une relações de sangue. A família, de “familus” em latim, significa servidor, escravo, doméstico, é um património ancestral e anterior ao latim. Confunde-se a família também com clã.
Uma criança nasce e precisa da mãe, precisa também do pai onde encontra a sua segurança e perde a angústia de estar só. A família é alimentada pelo vínculo de sangue e do nome, pelo poder do orgulho e da ambição e se revivem sentimentos, alegrias e tristezas, vitórias e fracassos que vêm dos bisavós, dos avós, dos pais... e que se quer transaccionar para o futuro.
A família tem a ver com a casa, o lar e a lareira. O coração material da casa é a lareira. A casa é o espaço da família e a família faz o Lar, a vida dá casa pelo amor quente que aparece e faz desse espaço íntimo, onde se vivem emoções, sentimentos, um núcleo social alimentado pelo amor que lhe dá força e coragem para viver e prestar culto pela saudade aos seus antepassados, como ainda seus protectores e permanentes numa lembrança perene.
Há 60 anos ainda se conheciam histórias da família até à 5ª ou 6ª geração. Tem, por isso, esta célula da comunidade, uma estrutura característica, de organização, disposição e número de componentes constituindo um núcleo com grandes capacidades de adaptação, reformulação e constituição do lar ou da casa - nas línguas (assim dizem claramente os galegos, os italianos, os romenos e de algum modo os germânicos e outras de origem indo-europeias de “casa sagrada”). O Lar é a casa sagrada, é o acolhimento, em francês; a origem, no catalão; início, em espanhol e, no maltês, cujo lar é dar.
No lar, de facto se dá e se recebe, é a mútua doação que existe na família, que em grego era o “amor fília”.
A própria palavra família, no seu radical, é comum na sua tradução a quase todas as línguas latinas ou germânicas. De facto, a família requer um espaço: a casa, o lar e a lareira.
Hoje são poucas as lareiras, local feito de material inflamável, para poder fazer fogo, lume para aquecer, para cozinhar, usando material flamável.
O Lar, “meu doce lar”, é o aconchego, a mansão, a intimidade, a privacidade que oferece uma casa à família. Esta só se sente bem estruturada nesse espaço e, corajosa, como numa fortaleza, onde só entra quem deixa entrar.
No paganismo existiam os deuses dos lares. Lar, em latim, significa lareira ou casa. Assim, existiam os deuses domésticos, tanto na cultura latina como na grega, para proteger a habitação e a família. Os romanos veneravam, deuses vestidos de vermelho (significando as chamas), junto à lareira, que era o centro da casa, junto da chaminé, que hoje é do “pai natal” como caminho que ligava o céu e a terra, e a terra ao céu. Eram os deuses familiares, protectores do lar que da casa passaram para os cruzamentos de caminhos e para as estradas.
Antigamente, era à volta da lareira e do lume que os nossos ancestrais passavam os serões de inverno, contando as suas histórias dos seus antepassados, que passavam de geração em geração, contos, anedotas, adivinhas e trabalhos manuais com o linho, a estopa, etc. ... enquanto outros se dedicariam ao jogo das cartas ou outros jogos, ou ainda a tocar uma víola, a concertina...e a cantar ou dançar.
A lareira aquecia o lar, dava vida ao lar, ambiente acolhedor ...
Hoje, é a televisão que “tira” a vida ao lar e as lareiras de hoje são outras como recuperadores de calor ou fogões de sala, onde já não é preciso ter tanto medo de incêndio da casa. Acabaram-se os abanadores, abanicos, ou o foles, as cinzas, a pá, a tenaz para mover a lenha no fogo, bem como outras para proteger os “olhares” das faíscas.
Mudaram-se os tempos ... mas nos corações de muitos ainda se conservam os valores sagrados de uma verdadeira família. A. Viana
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